20.9.05

Modernices!!!

Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar
"afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via gramatical - isto tem sido um fartote pegado!

As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber menção de
"auxiliares de apoio doméstico".

De igual modo, extinguiram-se nas escolas os contínuos; passaram todos a"auxiliares da acção educativa"

Os vendedores de medicamentos, inchados de prosápia, tratam-se de"delegados da propaganda médica".

E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em "técnicos de vendas".

Os drogados transformaram-se em "toxicodependentes" (como se os consumos de cerveja e de cocaína se equivalessem!);

O aborto eufemizou-se em "interrupção voluntária da gravidez";

Os gangues étnicos são "grupos de jovens";

Os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas,essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são"centros de decisão nacionais".

O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à"iliteracia" galopante.

Desapareceram outrossim, dos comboios, as classes 1.ª e 2.ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".

A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia: «Tenho uma família monoparental...» - eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade impante.

Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo".

Do mesmo modo, e para felicidade dos pais, agora"encarregados de educação", os brilhantes programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito,
"crianças de desenvolvimento instável".

Ainda há cegos, infelizmente, como nota na sua crónica o Eurico. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado "invisual". (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o "politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais...)

Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em "implementações", "posturas pró-activas", "políticas fracturantes" e outros barbarismos da linguagem.
E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico.

À margem da revolução semântica ficaram as putas. As desgraçadas são ainda agora quem melhor cultiva a língua.
Da porta do quarto para dentro, não há"politicamente correcto" que lhes dobre o modo de expressão ou lhes imponha a terminologia nova. Os amantes do idioma pátrio, se o quiserem ouvir pleno de vernaculidade, que se dirijam ao bordel mais próximo. Aí sim, um pénis
de 25 centímetros é um "car**** enorme" e nunca um "órgão sexual masculino sobredimensionado"; assim como dos impotentes, coitados, dizem elas
castiçamente que "não levantam o pau", e não que sofrem de "disfunção
eréctil".

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